sexta-feira, 10 de outubro de 2008

SER PROFESSORA E SUAS IMPLICAÇÕES HISTÓRICAS

Repensando a minha formação, como educadora, vou fazer uma breve viagem no tempo. Iniciei fazendo magistério, já que, segundo minha mãe, eu precisava terminar o Ensino Médio com uma profissão e os testes vocacionais apontaram para a Pedagogia. Muito contrariada, lá fui eu fazer magistério. No entanto, para minha surpresa, comecei a desempenhar bem o meu papel como professora. Sendo assim, certa vez, ao trabalhar em uma Creche Municipal no município onde meus pais moravam, surgiram os primeiros conflitos com alunos, pois os mesmos vinham de uma realidade difícil, onde a grande maioria fazia suas únicas refeições na Creche. Portanto, ao entrar em conflito com um aluno, o qual me agrediu fisicamente, decidi que nunca mais eu gostaria de ser professora, precisava buscar outra profissão onde eu não seria nunca mais agredida. Sendo assim, fiz vestibular e fui cursar licenciatura em Física na UFRGS, onde me formei em 2003. Trabalhei em um laboratório, em pesquisa acadêmica, durante 2 anos. Logo comecei a fazer uma cadeira do mestrado, visando uma carreira acadêmica, mas logo percebi que aquele ambiente era incompatível com o meu perfil. Eu precisava interagir com pessoas, precisava compartilhar o que aprendi e viver minha vida com toda a intensidade possível. Portanto, infelizmente, o Instituto de Física não me oferecia o que eu tanto buscava. Nos anos seguintes, após ter abandonado o mestrado e o laboratório, comecei a trabalhar como professora em duas escolas da rede pública estadual de Porto Alegre. Comecei a trabalhar em uma escola de Ensino Médio, lecionando a disciplina de Matemática e em outra escola de Ensino Fundamental, trabalhando com a disciplina de Ciências com duas turmas de 5ª série. Fui surpreendida pela minha velha paixão, trabalhar com crianças, ou até mesmo pré-adolescentes, e o melhor de tudo, eram de uma realidade carente, onde havia poucos recursos. No início me chateava pelo estado investir tão pouco em educação. Deparei-me com salas de aula caindo aos pedaços, falta de material para os alunos e pouca vontade por parte da administração. No entanto, nem tudo era ruim, os alunos que lá estavam precisavam de mim, do meu trabalho e da minha afetividade. Tudo isso me fez repensar o meu papel como educadora. Fui percebendo aos poucos que quem faz a escola são os alunos e o corpo docente. Portanto, mesmo que os recursos sejam fundamentais, sem força de vontade não há crescimento, não há construção. Contudo, juntei minha vontade de transformar à vontade de algumas colegas, as quais também tinham muita afeição por aquele público de alunos, e começamos a agir por conta própria, em benefício de um bem maior, os nossos alunos e a significância que precisávamos dar ao aprendizado deles.
Amo o meu trabalho nessa escola e, ao ler “Pedagogia da Autonomia”, alguns questionamentos que freqüentemente faço a mim, ainda ficaram como incógnitas. Paulo Freire nos chama a atenção do quanto é importante nossa postura ética diante dos nossos educandos, ou seja, não adianta falarmos de causas nobres se não aderirmos a elas. Concordo plenamente que uma das melhores formas de educarmos é, antes de tudo, dar o exemplo. Vejo tantas agressões físicas e verbais entre alguns alunos, lembrando que reproduzem em sala de aula comportamentos perfeitamente normais no ambiente em que vivem. Contudo, reforço o quanto é preciso trocar gentilezas nesse mundo que nem sempre é tão gentil para conosco. Lembro certo dia, onde falávamos do problema ambiental causado pelo lixo, em que comentava o quanto eu ficava chateada com pessoas que estavam no ônibus e jogavam lixo pela janela ao invés de usar o lixinho. Comentei que quando eu abria algum pacote ou embalagem na rua, o guardava no bolso ou na bolsa até chegar em casa e poder jogá-lo no lixo. Aí um aluno comentou o seguinte, “-por que eu tenho que cuidar para não sujar as ruas se a maioria das pessoas não faz isso?” respondi que realmente o que ele havia dito acontecia, mas era melhor eu fazer a minha parte e saber que contribui para melhorar a limpeza da minha cidade. Portanto, analisando o ocorrido, percebo que talvez eu não tenha conseguido convencer muitos deles, mas certamente alguns me ouviram e seguiram meu exemplo.
Também concordo com a seguinte afirmação: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidade para a sua construção.” Meu papel não é transmitir conhecimento, mas facilitar e estimular o aluno para que ele busque compreender o mundo que o cerca, construindo, através de suas experiências, uma base sólida. Daí a importância “da competência técnico científica e o rigor de que o professor não deve abrir mão”, segundo Paulo Freire, devemos ser suficientemente competentes para melhor auxiliarmos e estimularmos a curiosidade de nossos educandos nessa construção.
No entanto, até hoje permanece uma grande dúvida para mim. Segundo Freire, “a transgressão dos princípios éticos é uma possibilidade”. Então, fiquei refletindo sobre isso e lembrei de um aluno que seguidamente gosta de chamar a atenção através da transgressão. Aí surgem outros questionamentos, por que nós, educadores, ao desempenharmos nosso papel mostrando outras possibilidades, não conseguimos convencê-los de que um novo mundo é possível, de que podemos optar por caminhos menos tortuosos e que temos o direito, como cidadãos, de desfrutarmos de uma vida digna? Por que eles insistem em transgredir? Sei que, como humanos que somos, temos livre arbítrio, mas isso não justifica a escolha da violência. Ainda penso que os exemplos que temos são mais visíveis, pois como vamos falar de ética em um país que é governado por pessoas que transgridem as leis o tempo todo? Depois de muito pensar cheguei à conclusão que aqueles que são éticos e cumprem o seu dever ainda são a exceção. Portanto, ainda há muito trabalho pela frente para transformarmos a realidade daqueles que se julgam a margem da sociedade que consideram sua situação uma fatalidade. Precisamos transformar as exceções em regra.

Viviane Maus

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